Sociocracia – O que é? Como funciona? Exemplos

Há vários tipos de modelos de governo que propõem regular e dar um pouco de ordem à vida social e às relações humanas, tirando a condição do homem pré-histórico que vivia em eterno conflito. Das formas mais primitivas até as mais complexas resistiu em maior destaque a democracia, surgida na Grécia Antiga e que é predominante na maioria dos países, em especial no Ocidente.

Porém, há outros modelos que tentam superar as imperfeições da democracia ou mesmo oferecer formas mais aprimoradas de organização da sociedade visando outros objetivos. É o caso da sociocracia, que abordaremos neste artigo. Falaremos a respeito dos fundamentos da sociocracia, bem como suas origens, e também detalharemos como ela funciona.

O que é sociocracia?

A sociocracia é um tipo de administração participativa que proporciona às pessoas a condição de não apenas participar do processo, mas também de gerir em conjunto. Ou seja, em um governo, todas as decisões devem ser tomadas a partir da opinião de todos os membros da sociedade, um modelo coletivo de autogestão.

A sociocracia surgiu a partir do famoso filósofo francês Auguste Comte (1798 – 1857), considerado um dos fundadores da Sociologia e pai da teoria do Positivismo. Ele cunhou o termo que busca expressar a ideia de um governo da sociedade. Segundo Comte, trata-se de um sistema de governo fundamentado em decisões que consideram a opinião de sujeitos iguais integrantes de uma estrutura organizacional que seria parecida a um organismo vivo. A ideia é articular a sociedade para que ela participe da tomada de decisões, sendo fundamental o conceito de auto-organização.

“Sociocracia é uma ferramenta de governança da engenharia social contemporânea. É peça fundamental da engrenagem para a autogestão de organizações sociais, comunidades intencionais, redes e instituições afins. Se encontra em ambientes onde as iniciativas desejam manter-se vivas e saudáveis, salvaguardando com elas três pontos essenciais: a transparência, a equidade e a eficácia das suas decisões, ações e intenções”, explica a jornalista, educadora ambiental e mestre em empreendedorismo Henny Freitas, autora de um manual sobre o tema.

Para Henny Freitas, a sociocracia é uma governança dinâmica que se adapta e se molda conforme o seu uso, permitindo a participação até mesmo de instituições como multinacionais e organizações não-governamentais, tendo inteligência coletiva para tomar as decisões e se auto-organizarem, sendo o processo sempre retroalimentado pela coparticipação e corresponsabilidade dos indivíduos.

É importante não confundir sociocracia com democracia. A democracia sofreu diversas reformulações, chegando ao modelo atual de democracia representativa, na qual a população elege os seus escolhidos que vão representá-los nos seus devidos poderes (Legislativo ou Executivo), sendo suas ações legitimadas pelo voto. Já na sociocracia até poderiam ser eleitos representantes formais, porém, as pessoas participam de cada decisão tomada, fazendo com que todas as medidas passem por consulta popular.

Como funciona?

De acordo com Hermanus Meijerink, no artigo Sociocracia: o desafio da participação nas decisões, o modelo sociocrático é baseado em quatro regras básicas:

Estrutura em círculos

Nesta primeira regra, é definido o que e onde a tomada de decisões será participativa. É criada uma estrutura de círculos, formada por um grupo de indivíduos funcionalmente conectados entre si e com uma meta em comum. Eles se reúnem para tomar decisões sobre estruturas, políticas, estratégias etc., para um bom funcionamento do círculo. Todos da organização compõem o círculo, sendo a participação nas reuniões algo livre. Há casos em que organizações maiores possuem mais círculos com distintos níveis.

Dupla conexão entre círculos

Aqui, a regra determina que as decisões nos círculos devem ser definidas de maneira participativa, com membros de nível imediatamente inferior. A relação entre os círculos de níveis distintos ocorre entre dois sujeitos que estão no círculo acima, ou seja, o líder funcional ou um ou mais representantes deste círculo com o do que está logo abaixo, ajudando a manter os círculos atualizados.

Princípio de consentimento

A terceira regra impõe a maneira pela qual as decisões são tomadas e garante a participação de todos em igualdade, tendo como base o critério do argumento. “O princípio do consentimento rege a tomada de decisões nos círculos, ou seja, uma decisão é tomada se nenhum dos participantes tiver uma objeção fundamentada em argumentos”, diz Meijerink.

Eleição de pessoas

 A eleição ocorre de maneira participativa, em que os candidatos expõem seus argumentos e, após muito debate, chega-se a um consentimento em relação aos nomes escolhidos.

Por fim, vale salientar que há uma etapa importante na sociocracia que é a formação permanente dos seus membros, visando atender os objetivos da organização e capacitar a todos para participação das discussões. Segundo Meijerink, a ideia é que a sociocracia integre “as necessidades das atividades-fim da organização com as do processo participativo sociocrático”.

Jornalista com 15 anos de experiência, é mestre em América Latina pela Universidade de São Paulo (USP) na linha de pesquisa Práticas Políticas e Relações Internacionais.

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