Economia do Dom – O que é? Exemplos e Dias atuais

O mundo hoje está cada vez mais corrido, individualista e voltado para a aquisição de bens e de gasto pelo dinheiro, deixando coisas triviais como os relacionamentos de amizade e familiares em segundo plano. Em uma economia voraz, que está sempre atrás de mais recursos para serem consumidos e de mais pessoas para comprar, pensar em uma forma alternativa de troca econômica parece até mesmo irreal, não é mesmo?

Mas, há possibilidades, ao menos no plano das ideias, que podem ser colocadas em prática, aos poucos, no dia a dia. É o caso da economia do dom, uma teoria baseada mais na solidariedade e nas relações de reciprocidade, o que pode dar uma oportunidade para que as pessoas se tornem mais coletivas. Vamos aprender mais sobre esse conceito, como ele surgiu e exemplos práticos para o dia a dia, a seguir, no Gestão Educacional!

O que é economia do dom?

A economia do dom surgiu a partir do antropólogo e sociólogo francês Marcel Mauss (1872 – 1950), sobrinho de Émile Durkheim e considerado o pai da antropologia francesa. Mauss cunhou esse conceito para definir doações de bens ou de serviços com a obtenção de retornos indiretos. Também pode ser chamado de economia da doação, economia da dádiva ou cultura da dádiva.

O termo francês “don” foi apresentado em 1924, no Ensaio sobre a dádiva, em que o antropólogo analisou as dimensões simbólicas dos fluxos de objetos materiais, de rituais e pessoas dentro da estrutura social e percebeu modos distintos de tratar ofertas, trocas, bem como situações de reciprocidade. Mauss chegou à conclusão de que presentes ou mesmo serviços esconderiam uma espécie de reciprocidade obrigatória, sem haver um valor equivalente, deixando um sujeito sempre em dívida com o outro.

A partir disso surge a ideia da economia do dom, uma forma de organização social e não um contrato formal, em que há uma reciprocidade contínua de doações que demonstram um valor implícito próprio e diferente da economia de mercado, onde ocorrem as trocas diretas entre bens e serviços por meio de pagamentos.

Exemplos

Vale dizer que tais estudos foram efetivados em sociedades primitivas, em que Mauss pôde desenvolver sua pesquisa de forma que chegasse à economia do dom. Pesquisadores posteriores também se basearam em comunidades arcaicas e indígenas ao longo da história para perceber como a economia do dom se dava em tais lugares, confirmando as ideias levantadas por Mauss. Porém, cientistas sociais perceberam que há diversos sinais dessa cultura da dádiva nos dias atuais, convivendo ao mesmo tempo nas economias de mercado.

Atualmente, a economia do dom pode ser vista em vários processos da nossa vida social. Entre eles, podemos destacar a adoção, a doação de órgãos e de sangue, o sexo, a internet, o software livre, a informação, a ciência, a família e as festas. Essa economia da doação também se expressa num empréstimo a um amigo ou parente, ou mesmo em trocas de favores entre vizinhos, por exemplo. O mesmo ocorre em um nível superior, como em favores políticos.

Até mesmo ações de voluntariado e filantropia podem ser enquadradas na economia do dom, pois, ainda que sejam formadas por boas intenções, não estão isentas de uma reciprocidade social implícita, pois colocam em destaque as pessoas que ajudaram, oferecendo a elas prestígio que é transformado em capital e poder social, deixando-as mais fortes politicamente e com maior influência na sociedade.

Economia do dom nos dias de hoje

Para além desses exemplos, seria possível imaginar a economia do dom como uma alternativa aos processos atuais que vivemos? O doutor em sociologia na Universidade de Sorbonne, em Paris, Paulo Henrique Martins, é estudioso do assunto e considera que o resgate dessa economia levaria a uma restauração do valor da pessoa e a qualidade da relação entre os sujeitos sociais.

“O dom é um manifesto contra a banalização do ser humano que vem sendo feita pelo projeto neoliberal e a favor da dignidade do ser humano. A emergência de um paradigma da dádiva, sobre a qual se assenta a economia do dom, deve ser vista como expressão de uma reação que se faz lentamente a favor de uma reumanização que recoloque a inovação tecnológica, a riqueza e o poder a serviço de um ser humano compreendido na sua totalidade biossocial e política”, disse em entrevista ao IHU On-line.

Jornalista com 15 anos de experiência, é mestre em América Latina pela Universidade de São Paulo (USP) na linha de pesquisa Práticas Políticas e Relações Internacionais.

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